18/12/2021

BENZEDEIRAS DO SÉCULO XIX


BENZEDEIRAS

Há em Fafe, e em outras mais partes, dessas mulheres de virtude, que curam com palavras os desfiamentos dos braços e das pernas.

Poem para isso ao lume um púcaro com água, fazem-na ferver, e quando a fervura se activa, vazam então a agua num alguidar ou bacia, e põem o púcaro sobre ela com a boca para baixo, colocando depois a parte aberta ou desfiada do doente por cima do dito púcaro.

Toma então a benzedeira uma maçaroca de linho cru, fiada de propósito para semelhante objecto, enfia uma agulha nesse linho, e passa-a deste modo por baixo da parte doente, dando voltas sucessivas com o fio enfiado do linho, até à total, ou quase total absorção da água pelo púcaro, travando-se então o seguinte diálogo:

Benzedeira – Eu que é que aqui coso?

Doente – Carne aberta, fio torto.

Benzedeira – Isso mesmo é que eu coso:

Em louvor de S. Silvestre,

Quanto eu fizer, tudo preste.

 

E se o púcaro, durante este tempo da repetição das palavras de virtude, chegar a absorver a água toda, ou quase toda, sobre a qual está de fundo para cima e de boca para baixo, ficará então a parte torcida de todo sã da abertura ou desfiamento; aliás não poderá o enfermo sarar daquela vez, e ficarão sem virtudeas palavras da benzedeira.

Não é o primeiro púcaro que se enche na fonte, mas só o décimo, depois de cheios e despejados a fio os nove primeiros, o que se põe ao lume.

E quando, depois da fervura, o despejam e emborcam sobre a água, costumam colocar-lhe no fundo e em cruz, umas contas, um pente e uma tesoura, antes de repetir a fórmula.

Esta benzedura porém sofre algumas variantes de processo em algumas terras vizinhas.

 

F.M. da Cunha (Fafe)

 

Transcrito (com alteração ortográfica) do:

“ALMANACH DE LEMBRANÇAS LUSO-BRAZILEIRO” de 1859

Por: Alexandre Magno de Castilho

Lisboa, Imprensa Nacional, 1858

Página, 153